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ISSN 1679-6535
Dezembro, 2009
Fortaleza, CE

Patógenos Associados ao
Foto: Francisco das Chagas Oliveira Freire

Mandacaru (Cereus jamacaru


Dc.) no Estado do Ceará

Francisco das Chagas Oliveira Freire1

O mandacaru é um representante nativo do bioma e Ceará em 1972, oportunidade em que seu agente
Caatinga, perfeitamente adaptado às condições etiológico, o fungo Dichotomophthora cactacearum,
climáticas do Semiárido nordestino. Sua utilização foi descrito como uma nova espécie (PONTE e FREIRE,
como alternativa forrageira costuma ocorrer durante 1972, 1972a).
longos períodos de seca na Região Nordeste do
Brasil, sendo empregado como volumoso estratégico A doença é mais comum nos períodos chuvosos,
e como fonte de água na alimentação de ruminantes. praticamente desaparecendo na época seca. A in-
fecção ocorre apenas na parte superior das plantas,
Atualmente, o potencial do mandacaru como planta
as quais exibem lesões escuras, azuladas, às vezes
ornamental tem sido demonstrado, especialmente o
com abundante formação de estruturas vegetativas
mandacaru sem espinhos, uma variedade descoberta
e reprodutivas do patógeno sobre as áreas lesiona-
vegetando espontaneamente no Estado do Ceará
das (Figura 1A). A infecção pode ser reproduzida
(CAVALCANTI e RESENDE, 2006).
facilmente por meio de inoculação em mudas enva-
A despeito de sua aparente rusticidade, o manda- sadas (Figura 1B).
caru pode ser afetado por inúmeros patógenos. O
objetivo do presente trabalho é relatar os principais
patógenos associados ao mandacaru no Estado Podridão-de-fitóftora
do Ceará, bem como discutir sugestões para seu
controle. Doença nova para esta planta, sendo este o seu
primeiro registro no Brasil. O agente causal, Phyto-
Podridão-azul phthora sp., pertence à família Pythiaceae, classe
dos Oomicetos, tendo sido recentemente excluído
Principal enfermidade do mandacaru no Nordeste, do Reino dos Fungos e incluído no novo Reino
foi detectada nos Estados do Rio Grande do Norte Straminipila.

1
Engenheiro Agrônomo, Ph. D. em Fitopatologia, pesquisador da Embrapa Agroindústria Tropical, Rua Dra. Sara Mesquita 2270, Pici,
tel. (85) 3391-7280, Caixa Postal 3761, CEP 60511-510, Fortaleza,CE. E-mail: freire@cnpat.embrapa.br
2 Patógenos Associados ao Mandacaru (Cereus jamacaru Dc.) no Estado do Ceará

A infecção surge na parte basal das plantas, cau- infectados, seguido de apodrecimento e, invaria-
sando rápida necrose do caule e raízes. Às vezes, velmente, levando a planta à morte. O fungo já foi
uma linha clorótica surge entre a região lesionada detectado em mudas produzidas in vitro, confirman-
e os tecidos ainda sadios (Figura 2) do seu comportamento endofítico (Figura 3B).
Foto: Francisco das Chagas Oliveira Freire

Foto: Francisco das Chagas Oliveira Freire


A B A B
Figura 1. Sintomas de podridão-azul em planta adulta (A) Figura 3. Planta adulta de mandacaru com lesão apical
e em mudas de mandacaru inoculadas com Dichotomo- por Lasiodiplodia theobromae (A). O mesmo patógeno em
phthora cactacearum (B). mudas produzidas in vitro (B).
Foto: Francisco das Chagas Oliveira Freire

Antracnose
Doença esporádica, foi detectada apenas em
poucas plantas envasadas, especialmente durante
o período chuvoso. Causada pelo fungo Colletotri-
chum gloeosporioides, a enfermidade foi observada
afetando a parte terminal das plantas, provocando
uma extensa lesão de coloração azulada, às vezes
com linhas concêntricas (Figura ).
Foto: Francisco das Chagas Oliveira Freire

Figura 2. Planta adulta de mandacaru com sintomas de


podridão-de-fitóftora causados por Phytophthora sp.

Podridão-de-lasiodiplodia
Representando também uma nova ocorrência para
o mandacaru no Brasil, esta podridão é causada
pelo fungo Lasiodiplodia theobromae, um organismo
reconhecidamente polífago, com uma extensa lista
de hospedeiros de importância econômica, não
apenas no Brasil, mas também em outros países
(FREIRE et al., 200).

No mandacaru, esse patógeno pode iniciar a infecção


tanto na parte basal quanto no ápice (Figura 3A). Os Figura 4. Planta jovem de mandacaru exibindo sintomas
sintomas típicos são o escurecimento dos tecidos de antracnose (Colletotrichum gloeosporioides).
Patógenos Associados ao Mandacaru (Cereus jamacaru Dc.) no Estado do Ceará 3

Meloidoginose do gênero Phoma, tem estado presente em um tipo


de lesão semelhante a uma verrugose (Figura 6B).
O parasitismo de nematóides-das-galhas em Cereus
jamacaru e Cereus macrogonus já havia sido relata-

Foto: Francisco das Chagas Oliveira Freire


do em condições naturais (PONTE,1969,1973).
No presente trabalho, a infestação por Meloidogyne
incognita foi observada em planta envasada. A planta
exibia amarelecimento típico de deficiência nutricio-
nal (Figura 5A), com numerosas galhas radiculares
(Figura 5B). Um aspecto interessante foi a presença
do fungo Fusarium solani associado a lesões radi-
culares e do caule do mandacaru. A patogenicidade
desse fungo, entretanto, não foi testada, podendo
tratar-se apenas de um saprófita. Importante, entre-
tanto, é a reconhecida capacidade do M. incognita
A B
em parasitar plantas envasadas de mandacaru.
Figura 6. Lesão necrótica arredondada causada por Scyta-
lidium lignicola em mandacaru (A). Sintomas semelhantes
à verrugose provavelmente causada por Phoma sp. (B).
Foto: Francisco das Chagas Oliveira Freire

Considerações Finais
O interesse para a utilização do mandacaru como
planta ornamental é recente, motivo pelo qual se
espera o surgimento de muitos problemas fitopa-
tológicos em plantas envasadas e em jardins. Para
que essa espécie seja cultivada definitivamente
como ornamental, o manejo da adubação, subs-
A B trato e fornecimento de água devem ser melhor
estudados. Quanto ao controle de fitopatógenos,
Figura 5. Planta de mandacaru com amareleciemento pro- as informações são ainda mais escassas. Estudos
vocado pelo parasitismo de Meloidogyne incognita (A).
preliminares conduzidos pela Embrapa Agroindústria
Sistema radicular com galhas (B).
Tropical têm demonstrado que, no caso de proteção
de cortes e lesões, produtos à base de oxicloreto
de cobre em água (em dosagens de 3 g a 5 g do
Outros Patógenos produto comercial/litro de água) ou adicionados de
cal virgem (calda ou pasta bordaleza) são eficientes
Além dos problemas relatados, outros patógenos na prevenção do desenvolvimento de patógenos.
têm sido observados no mandacaru, mas encon-
tram-se ainda em fase de estudo. Por exemplo,
a mancha-negra, na qual o fungo Drechslera sp. é Agradecimentos
encontrado em associação com um inseto da ordem
Lepdoptera, pertencente à família Piralidae, e ainda O autor agradece ao Fundeci pelo apoio financeiro
sem identificação confirmada. Plantas adultas de durante o desenvolvimento do presente trabalho.
mandacaru têm exibido, ademais, lesões necróticas
salientes, de coloração marrom-clara, às vezes arre-
dondadas ou se estendendo ao longo do caule (Figura Referências
6A). A partir dos tecidos lesionados, foi isolado o
CAVALCANTI, N. B.; RESENDE, G. M. Efeito de diferentes subs-
fungo Scytalidium lignicola Pes, citado como pató-
tratos no desenvolvimento do mandacaru sem espinhos (Cereus
geno da palma forrageira (Opuntia ficus-indica) em hildemannianus K. Schum). Revista Caatinga, v. 19, n. 3,
Pernambuco (MOURA et al., 1998). Um celomiceto, p. 255 -260, 2006.
 Patógenos Associados ao Mandacaru (Cereus jamacaru Dc.) no Estado do Ceará

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Comunicado Exemplares desta edição podem ser adquiridos na: Comitê de Presidente: Antonio Teixeira Cavalcanti Júnior
Técnico, 148 Embrapa Agroindústria Tropical Publicações Secretário-Executivo: Marco Aurélio da R. Melo
Endereço: Rua Dra. Sara Mesquita 2270, Pici, Membros: Ana Cristina Portugal Pinto de Carvalho,
Ministério da CEP 60511-110 Fortaleza, CE Antonio Calixto Lima, Diva Correia, Ingrid Vieira
Agricultura, Pecuária
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Expediente Supervisor editorial: Marco Aurélio da Rocha Melo
Revisão de texto: Jane Maria de Faria Cabral
1 edição on line: dezembro de 2009
a
Editoração eletrônica: Arilo Nobre de Oliveira
Normalização bibliográfica: Rita de Cassia Costa Cid

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