Biocontrole do mal-das-folhas da seringueira
179
Compatibilidade de Dicyma pulvinata com defensivos agrícolas
e eficiência do biocontrole do mal-das-folhas
da seringueira em campo
Débora Ferreira Melo(1), Sueli Corrêa Marques de Mello(2), Carlos Raimundo Reis Mattos(3)
e Saulo Emilio Almeida Cardoso(3)
(1) Universidade de Brasília, Departamento de Fitopatologia, Caixa Postal
4457, CEP 70910-900 Brasília, DF. E-mail: deboramelo@pop.com.br
Recursos Genéticos e Biotecnologia, Caixa Postal 02372, CEP 70770-900 Brasília, DF. E-mail: smello@cenargen.embrapa.br
(3) Plantações Michelin da Bahia Ltda., Caixa Postal 02, CEP 45435-000 Ituberá, BA. E-mail: carlos.mattos@br.michelin.com,
saulo.cardoso@br.michelin.com
(2) Embrapa
Resumo – O objetivo deste trabalho foi avaliar quatro isolados do fungo antagonista Dicyma pulvinata quanto à
compatibilidade com defensivos agrícolas e adjuvantes, e a eficiência desses isolados no controle do mal-das-folhas
(Microcyclus ulei) da seringueira (Hevea sp.) em campo. A compatibilidade dos isolados com defensivos e
adjuvantes foi avaliada com base no crescimento micelial e na esporulação do fungo, em testes conduzidos in
vitro. Para avaliação da eficiência do antagonista contra M. ulei, em campo, os quatros isolados do antagonista
foram comparados ao controle exercido pelo tratamento com os fungicidas propiconazol + mancozeb. Os ensaios
conduzidos em laboratório indicaram a incompatibilidade de D. pulvinata com os fungicidas benomyl, carbendazim,
mancozeb, propiconazol e, ainda, com o inseticida acaricida endosulfan. Dois dos adjuvantes testados (Tween 20
e Tween 80) não afetaram o desenvolvimento do fungo. Foi comprovada a ação do antagonista D. pulvinata
sobre M. ulei, em campo, com destaque para os isolados CEN 62 e CEN 93, que apresentaram eficiência de
controle semelhante ao tratamento fungicida padrão.
Termos para indexação: Microcyclus ulei, Hevea, controle biológico, controle químico.
Compatibility of Dicyma pulvinata with pesticides and biocontrol efficiency
of South American leaf blight of rubber tree under field conditions
Abstract – The objective of this work was to evaluate four isolates of the antagonist fungus Dicyma pulvinata
in terms of its compatibility with chemical pesticides and adjuvants products, and the efficiency of these isolates
as biocontrol agent against South American leaf blight (Microcyclus ulei) of rubber tree (Hevea sp.) under field
conditions. Isolates compatibility with chemical pesticides and adjuvants was evaluated on mycelial growth and
fungus sporulation in vitro. To assess the efficiency of the antagonist against M. ulei under field conditions, the
four isolates were compared to the control by the fungicide mixture propiconazol + mancozeb. The assays
showed incompatibility of the antagonistic fungus with the fungicides benomyl, carbendazim, mancozeb,
propiconazol, besides the insecticide-acaricide endosulfan. Two of the adjuvants tested did not affect the
fungus development. It was demonstrated the action of D. pulvinata against M. ulei, in the field, especially for
the isolates CEN 62 and CEN 93, which showed control levels similar to the fungicide standard treatment.
Index terms: Microcyclus ulei, Hevea, biological control, chemical control.
Introdução
A borracha natural produzida pela seringueira
(Hevea spp.), particularmente pela espécie
H. brasiliensis (Willd. ex Adr. de Juss.) Muell. Arg., é
de grande importância na economia mundial, além de
contribuir para a conservação do solo e melhoria do
ambiente (Instituto de Pesquisas e Estudos Florestais,
2007). Entre as diversas doenças que atacam a cultura
destaca-se o mal-das-folhas, causado pelo fungo
Microcyclus ulei (Henn.) Arx, que, no século passado,
impediu o estabelecimento de seringais na Amazônia e
é responsável pela fraca expansão da heveicultura no
Brasil. Essa doença, além de reduzir a produção de látex,
debilita as plantas e as leva à morte após desfolhamentos
sucessivos (Gasparotto & Ferreira, 1989).
O fungo M. ulei possui elevada capacidade de
mutação (Mattos et al., 2003), o que lhe permite adaptar-se
a diferentes condições climáticas (Gasparotto &
Junqueira, 1994). Esse fato poderá torná-lo grande
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.43, n.2, p.179-185, fev. 2008
180
D.F. Melo et al.
problema também nas áreas de cultivo recentes (zonas
de escape), para as quais a cultura se expandiu em
virtude das condições de temperatura e umidade
desfavoráveis ao desenvolvimento da doença (Tavares
et al., 2004).
Após a constatação de que o fungo Dicyma pulvinata
(Berk. & M.A. Curtis) Arx [syn. Hansfordia pulvinata
(Berk. & M.A. Curtis) S. Hughes] coloniza estromas
do M. ulei e destrói tanto os ascostromas como as
estruturas anamórficas do patógeno (Fusicladium
macrosporum J. Kuÿper), levantou-se a possibilidade
de controlar biologicamente a doença, pelo uso desse
micoparasita (Mello et al., 2006).
Junqueira & Gasparotto (1991) mencionam que o
controle do mal-das-folhas, com o micoparasita
D. pulvinata, se associado a outros métodos de controle,
como resistência genética e práticas de controle cultural,
poderá ter muito valor prático nas regiões úmidas e
quentes como o Estado do Amazonas e o sul do Estado
da Bahia. De acordo com esses autores, a presença do
M. ulei teria permitido a multiplicação de D. pulvinata
e reduzido a densidade do patógeno na área de plantio,
em experimento realizado em seringal da Embrapa
Amazônia Ocidental, em Manaus, AM. Acrescente-se
a isso que nas áreas de escape, em que o patógeno é
problema particularmente sério em viveiros, D. pulvinata
pode ser usado como um dos componentes do manejo
sanitário das mudas. Nesses locais, onde a alta incidência
da doença tem determinado a redução do crescimento
e diminuição da percentagem de plantas para serem
enxertadas (Romero et al., 2006), a aplicação do agente
de biocontrole é facilitada pela baixa estatura das
plantas.
O controle biológico de patógenos foliares pode
apresentar baixa eficiência em campo, geralmente, em
razão da falta de um bom veiculante de inóculo, da
inadequação de tecnologias de aplicação ou, ainda, do
impacto causado pelo ambiente. A obtenção de
formulação adequada é um importante fator para o
sucesso dos agentes de biocontrole, quando submetidos
a variações ambientais (Fravel et al., 1998). Embora uma
gama de agentes de biocontrole esteja disponível, a
adoção efetiva dessa tecnologia requer melhor
entendimento das interações presentes na natureza.
Durante a seleção de microrganismos antagônicos a
fitopatógenos, os ensaios in vitro, muitas vezes
necessários para estudos específicos, são insuficientes
para se determinar o comportamento do antagonista in
vivo. Desse modo, os ensaios de campo são
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.43, n.2, p.179-185, fev. 2008
fundamentais, visto que a ação antagonística depende
de diversos fatores bióticos e abióticos (Bettiol, 1991).
A adição de adjuvantes ao inóculo é um recurso capaz
de auxiliar o agente de biocontrole na superação de
condições adversas e possibilitar a colonização do
hospedeiro de maneira mais rápida e eficiente. Sob esse
aspecto, considera-se importante encontrar aditivos que
não causem efeitos tóxicos ao agente de biocontrole e
que promovam melhorias em uma ou mais
características essenciais, para o estabelecimento da
interação antagonista (Fravel et al., 1998).
O uso combinado de agentes de controle biológico
com pesticidas químicos, para obter efeitos sinergísticos
ou aditivos contra o organismo alvo, é outra linha de
estudo que tem despertado atenção. Doses reduzidas
de fungicidas podem estressar e enfraquecer o patógeno
e tornar seus propágulos mais suscetíveis ao ataque
subseqüente pelo antagonista (Spadaro & Gullino, 2005).
Este trabalho teve como objetivo avaliar quatro
isolados do antagonista D. pulvinata, quanto à
compatibilidade com defensivos agrícolas e adjuvantes,
e quanto à eficiência no controle de M. ulei em campo.
Material e Métodos
Foram utilizados os isolados CEN 58, CEN 62,
CEN 91 e CEN 93 de D. pulvinata, procedentes de
Ouro Preto, RO, Belém, PA, Ituberá, BA e Ponte de
Lacerda, MT, respectivamente. Esses isolados fazem
parte da Coleção de Fungos para Controle Biológico, da
Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia
(Cenargen).
Os ensaios para avaliação do efeito de defensivos e
adjuvantes no crescimento e esporulação de
D. pulvinata, bem como a produção de inóculo para
uso no campo, foram desenvolvidos no Laboratório de
Fitopatologia, do Núcleo Temático de Controle Biológico
do Cenargen. Exceto em casos especificados, as
colônias foram incubadas a 25ºC, com fotoperíodo de
12 horas. O fotoperíodo foi simulado por meio de quatro
lâmpadas fluorescentes de 20 W, à luz do dia, instaladas
na porta da câmara de crescimento (Nova Técnica,
modelo NT 708 – AT), onde as culturas foram mantidas
em placas de Petri.
O experimento de campo foi conduzido de maio a
novembro de 2005, em jardim clonal das Plantações
Michelin Ltda., no Município de Ituberá, no litoral sul da
Bahia, onde a incidência do mal-das-folhas vem
ocorrendo com elevada severidade, ao longo dos anos.
Biocontrole do mal-das-folhas da seringueira
Na avaliação de efeitos de defensivos agrícolas no
crescimento e esporulação dos isolados de D. pulvinata,
os tratamentos foram compostos pelos fungicidas
benomyl, carbendazim, propiconazol; pelo fungicida e
acaricida mancozeb (representado por dois produtos
comerciais diferentes), e pelos inseticidas e acaricidas
malathion e endosulfan. Esses produtos foram utilizados
nas doses equivalentes a um terço das concentrações
recomendadas, pois em testes prévios notou-se a inibição
total de crescimento do agente de biocontrole, quando
foi adicionada a dose recomendada do produto. Baixas
doses de fungicidas (e de inseticidas, em menor grau)
podem funcionar como fator de estresse e, dessa forma,
tornar o patógeno mais vulnerável ao antagonista
(Spadaro & Gullino, 2005). Cada produto foi adicionado
em frascos individuais, com meio à base de batatadextrose-ágar (BDA), devidamente esterilizados e
resfriados a 40ºC. O meio de cada frasco foi, então,
vertido em placas de Petri. Como testemunhas, foram
preparadas placas com meio BDA sem defensivos.
Cada placa recebeu um disco de 9 mm de colônias
do fungo, com dez dias de idade, crescidas em BDA.
Aos 16 dias de cultivo, avaliou-se o crescimento do fungo
por meio de medidas do diâmetro das colônias e, aos
17 dias, por meio da esporulação. A contagem de
esporos foi realizada com o auxílio de uma câmara de
Neubauer, em alíquotas de suspensões obtidas pela
adição de 10 mL de solução de Tween 80 (0,02%), em
cada placa, e raspagem das colônias com a alça de
Drigalski.
Realizou-se a análise de variância para delineamento
inteiramente casualizado em esquema fatorial (isolados
x defensivos). As médias foram comparadas pelo teste
de Tukey, a 5% de probabilidade.
Para avaliação do efeito de adjuvantes sobre o
desenvolvimento de colônias dos isolados de
D. pulvinata, utilizaram-se oito produtos que, à
exceção de sacarose, são de uso corrente na
agricultura: Agral [nonil fenoxi poli (etilenoxi) etanol],
Assit (óleo mineral parafínico), Extravon (aquil-fenol
poliglicoleter), Iharaguen’s (polioxieltileno alquifenol
éter), óleo Natur’l (ésteres de ácidos graxos com
glicerol), Tween 80 (polioxietileno monolaurático),
Tween 20 (polioxietileno monolaurático) e sacarose.
Placas de Petri com meio BDA receberam, cada uma,
um disco com 9 mm de colônias do fungo,
desenvolvidas nas mesmas condições descritas
anteriormente. Esses discos foram previamente
mergulhados, por 24 horas, em soluções preparadas
181
com 20 mL de água destilada estéril, com os
respectivos adjuvantes nas dosagens recomendadas.
Prepararam-se, também, dois tratamentos
testemunha: um, cujos discos de cultura foram
mergulhados em água destilada durante 24 horas e,
então, transferidos para placas com BDA, e outro, cujos
discos foram transferidos diretamente para as placas,
sem qualquer tratamento. A incubação e avaliação foram
realizadas da mesma forma que no experimento com os
defensivos.
Para avaliação da eficiência dos isolados de
D. pulvinata no biocontrole do mal-das-folhas em
campo, o experimento foi conduzido em jardim clonal,
com delineamento experimental de blocos ao acaso, em
esquema fatorial 6x4, em que o fator a foi representado
pelos tratamentos (isolados do fungo, fungicida e
testemunha) e o fator b por clones de H. brasiliensis,
com quatro repetições. Os tratamentos (fator a) foram
os seguintes: pulverização de suspensões ajustadas à
concentração de 3.105 esporos mL-1, preparadas com
os isolados CEN 91, CEN 93, CEN 58 e CEN 62 de
D. pulvinata (tratamentos 1 a 4, respectivamente);
pulverização da mistura dos fungicidas propiconazol e
mancozeb, nas concentrações de 3,5 mL e 2,5 g,
respectivamente, do ingrediente ativo por litro de água,
acrescida de 5 mL L-1 de óleo Natur’l (tratamento 5); e
testemunha (tratamento 6). As parcelas do tratamento
testemunha receberam pulverização com água.
O fator b foi constituído pelos clones IRCA 41,
IRCA 109, IRCA 111 e IRCA 230, com cerca de três
anos de idade, todos altamente suscetíveis a M. ulei
(Mattos et al., 2003) e plantados lado a lado, sob as
mesmas condições de solo e clima.
As parcelas constituíram-se de cinco a sete fileiras
de 14 m, com sete plantas por fileira, em média. A área
útil da parcela foi composta pelas duas fileiras centrais,
e as demais foram consideradas bordaduras.
Para a preparação dos tratamentos com o agente de
biocontrole usado no campo, inicialmente, cultivaram-se
os isolados em erlenmeyers de 125 mL, com 75 mL de
meio líquido SDY (peptona, 10 g L-1; dextrose, 40 g L-1;
extrato de levedura, 10 g L-1). Cada frasco recebeu
cinco discos de colônias, obtidas como descrito nos
experimentos anteriores, e foi mantido sob agitação em
agitador orbital (150 rpm) a 25ºC, durante sete dias.
O micélio produzido (20 mL) foi transferido para sacos
de plástico autoclavavéis (42 cm de comprimento e
28 cm de largura), com o substrato sólido (200 g de arroz
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.43, n.2, p.179-185, fev. 2008
182
D.F. Melo et al.
parboilizado, previamente umedecido com 120 mL de
água destilada e autoclavado a 120oC, durante 20 min).
O cultivo ocorreu em sala de incubação adaptada para
tal fim, onde a temperatura se manteve a 25ºC, com
fotoperíodo de 12 horas alternadas em claro/escuro.
Após 17 dias de crescimento, os sacos foram abertos, e
o fungo foi submetido à secagem em BOD a 28ºC por
três dias.
O fungo foi extraído do substrato por meio de duas
lavagens com solução de Tween 80 a 0,02%, seguidas
de filtração. A suspensão, depois de ajustada à
concentração de 3x105 esporos mL-1, foi aspergida sobre
a superfície foliar das plantas, com pulverizador costal
pressurizado com CO2, ao volume de calda de 0,13 L
por planta. Foram realizadas seis aplicações quinzenais,
sempre ao entardecer.
As avaliações se iniciaram 45 dias após a primeira
aplicação dos tratamentos e foram repetidas duas vezes,
em intervalos de 45 dias, em todas as plantas que
apresentaram lançamentos com folhas no estádio C ou
CD (Hallé et al., 1978). Para determinação da
severidade da doença, utilizou-se a escala diagramática
modificada (Mattos et al., 2003), baseada na área foliar
lesionada, com exame de nove folíolos por planta.
Avaliaram-se dez plantas ao acaso, por tratamento, em
cada bloco. Os dados obtidos foram utilizados para
cálculo da área abaixo da curva de progresso da doença
(AACPD), representada pela soma da área dos polígonos
para cada avaliação, tendo-se considerado o tempo (dias)
como variável independente, e a severidade (%) como
variável dependente (Shaner & Finney, 1977).
A presença de D. pulvinata sobre as lesões de
M. ulei foi observada com o auxílio de lupa manual, com
aumento de dez vezes. Para a confirmação do agente
de biocontrole, foram coletados e examinados ao
microscópio quatro folíolos de cada tratamento, tendose determinado a percentagem de estromas de M. ulei
colonizados pelo hiperparasita. Três avaliações foram
realizadas a intervalos de 45 dias.
Foi realizada a análise de variância de cada uma das
variáveis e suas interações, para verificar o efeito dos
tratamentos e clones. As médias foram comparadas pelo
teste de Tukey, a 5% de probabilidade.
Resultados e Discussão
Na avaliação dos efeitos de defensivos agrícolas sobre
o desenvolvimento de D. pulvinata, observou-se inibição
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.43, n.2, p.179-185, fev. 2008
do crescimento de colônias com os produtos utilizados,
em todos os isolados. Entretanto, no caso do malathion,
a inibição foi parcial, ou seja, ele permitiu o
desenvolvimento das colônias, embora, para todos os
isolados esse desenvolvimento tenha sido
significativamente inferior ao obtido na testemunha.
Nas observações realizadas aos 16 dias de incubação
das culturas, o isolado CEN 58 apresentou maior valor
médio de diâmetro das colônias em presença do
malathion, enquanto os demais isolados não diferiram
significativamente entre si. Não houve interação entre
tratamentos e isolados e, assim, são apresentadas as
médias gerais para todos os isolados (Figura 1 A).
A esporulação de D. pulvinata foi constatada, na
avaliação realizada aos 17 dias de incubação, tanto nas
placas testemunha quanto naquelas com malathion
(Figura 1 B). A interação foi significativa para inseticida
x isolado. O valor médio de produção de esporos na
testemunha não diferiu dos observados nos tratamentos
com inseticida, para os isolados CEN 62 e CEN 93,
que também não diferiram entre si. Para o isolado
CEN 91, detectou-se diferença significativa entre os
tratamentos testemunha (que teve maior produção de
esporos) e inseticida. Neste tratamento, o CEN 91 não
diferiu dos dois isolados anteriores, ao passo que no
tratamento testemunha ele diferiu de todos os isolados.
Para o isolado CEN 58, a diferença foi significativa
não só entre os tratamentos testemunha e inseticida,
mas também em comparação aos isolados CEN 62
e CEN 93, quando em presença do inseticida.
Na ausência do inseticida, o CEN 58 apresentou a
média mais elevada de produção de esporos e,
também, diferiu de todos os outros isolados.
Spadaro & Gullino (2005) preconizam a possibilidade
de combinação de controle químico e biológico, por meio
de aplicações de doses relativamente baixas dos
produtos químicos, com o propósito de estressar o
patógeno e torná-lo vulnerável aos microrganismos
antagônicos. Resultados favoráveis na implementação
dessa estratégia foram obtidos com o biofungicida
AQ10 (Ampelomyces quisqualis), usado no
biocontrole de Podosphaera xanthii, que mostrou ser
compatível com os fungicidas myclobutanil e
triadimeton, em estudos realizados por Shishkoff &
McGrath (2002), nas concentrações de 10 µg mL-1 e
100 µg mL-1, respectivamente. Ainda, a substituição de
alguns dos tratamentos químicos pelo agente biológico
(alternância de tratamentos) além de reduzir a
quantidade de químicos liberada no ambiente, resultaria
Biocontrole do mal-das-folhas da seringueira
em controle mais efetivo da doença. Os resultados
obtidos neste trabalho indicaram, no entanto, que há
incompatibilidade entre D. pulvinata e os fungicidas
avaliados, mesmo em baixas concentrações.
Os inseticidas endosulfan e malathion também
exerceram efeitos negativos sobre o desenvolvimento
do fungo in vitro, o que indica que também no tocante
ao uso de inseticidas químicos, para controle de
eventuais pragas, deverão ser buscadas formas de
utilização que minimizem os efeitos tóxicos ao fungo
antagonista.
Com relação ao uso de adjuvantes, os resultados
obtidos mostraram que não houve efeito de nenhum
desses produtos no crescimento micelial dos isolados.
Quanto à esporulação, entretanto, observou-se
Diâmetro das colônias (cm)
3,0
A
A
2,5
a
2,0
b
1,0
B
0,5
0,0
T
M
CEN
58
Tratamentos
T
Esporulação
(105 esporos mL-1)
b
b
1,5
6
5
4
3
2
1
0
M
CEN 58
Aa
CEN CEN
62
91
Isolados
CEN 62
CEN 91
CEN
93
CEN 93
183
interação entre os fatores (adjuvante x isolado). Não
foram detectadas diferenças significativas entre
tratamentos, com os isolados CEN 91 e CEN 93.
Com os isolados CEN 58 e CEN 62, houve diferença
significativa não só entre tratamentos, em alguns
casos, mas também maior variedade de resposta,
quando comparados entre si e aos outros dois isolados
(Tabela 1).
A despeito da reconhecida importância do
desenvolvimento de formulações, para o sucesso de
agentes de biocontrole de fitopatógenos (Mitchell
& Taber, 1986; Burges, 1998; Fravel et al., 1998;
Greaves et al., 1998; Oshiman, 2000; Shishkoff &
McGrath, 2002), há relativamente poucos estudos
que demonstram os benefícios de adjuvantes ou
substâncias carreadoras de propágulos fúngicos.
No caso específico de D. pulvinata, Mitchell &
Taber (1986) relataram maior colonização de lesões
de Cercosporidium personatum por um isolado
desse antagoni sta, quando os esporos foram
suspensos em Tween 80 e glicerol, ambos em
diversas concentrações, e CMC (metilcelulose) nas
concentrações de 0,4 e 0,8%.
Neste trabalho, os sufactantes Tween 20 e
Tween 80, nas concentrações utilizadas, não
afetaram a esporulação de nenhum dos quatro
isolados de D. pulvinata e poderão contribuir para
uma melhor ação do agente de biocontrole em
campo. Ambos os produtos podem servir como
emulsificadores, dispersantes e estabilizadores e,
B
Ab
Ba
Ac
Ab
Bab
Ac
Ab
Tabela 1. Produção de esporos (x105 esporos mL-1) em meio
BDA, em colônias de quatro isolados de Dicyma pulvinata,
desenvolvidas a partir de discos de micélio tratados com
diferentes adjuvantes(1).
Tratamento
CEN 58
CEN 62
CEN 91
CEN 93
Isolados
Testemunha
Malathion
Figura 1. Desenvolvimento de Dicyma pulvinata em meio de
cultivo BDA como testemunha (T), e meio acrescido de
malathion (M). A: diâmetro médio de colônias aos 16 dias de
cultivo; B: esporulação aos 17 dias de cultivo. Letras
maiúsculas comparam os tratamentos com malathion e
testemunha, em cada isolado, e letras minúsculas comparam
as médias entre os isolados.
Agral
Assist
Extravon
Iharanguen’s
Óleo Natur’l
Tween 80
Tween 20
Sacarose
Água
Sem tratamento
CEN 58
1,38BCa
1,24BCa
1,31BCa
1,13Ca
1,44BCa
1,93Aa
1,56ABCa
1,34BCa
1,62ABa
1,70ABa
Isolados
CEN 62
CEN 91
1,05ABab
1,23Aab
0,89Ba
1,22Aa
0,91Bb
0,84Ab
1,14ABa
1,20Aa
1,13ABab
1,26Aab
1,19ABb
1,03Ab
0,99ABb
1,16Ab
1,10ABab
0,91Ab
1,44Aab
1,22Abc
1,39Aab
1,22Ab
CEN 93
0,85Aa
0,92Aa
0,90Ab
1,05Aa
0,95Ab
0,92Ab
1,05Ab
0,94Ab
1,05Ac
1,04Ab
(1)Médias
seguidas por letras iguais, maiúsculas nas colunas e minúsculas
nas linhas, não diferem entre si pelo teste de Tukey, a 5% de
probabilidade.
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.43, n.2, p.179-185, fev. 2008
D.F. Melo et al.
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.43, n.2, p.179-185, fev. 2008
Experimentos conduzidos em casa de vegetação
por Mello et al. (2006), com 20 isolados de
D. pulvinata, indicaram maior agressividade do
isolado CEN 93 ao M. ulei. No presente trabalho,
esse isolado apresentou eficiência semelhante aos
demais testados sob condições de campo, em termos
de colonização dos estromas do patógeno.
Sucesso parcial do controle biológico tem sido
observado em avaliações conduzidas em campo com
diversos agentes de controle biológico (Mitchell et al.,
1986; Kupper et al., 2003; Shternshis et al., 2005).
A
A
4
AACPD (x1000)
por serem, em geral, menos tóxicos do que os
sufactantes iônicos (Greaves et al., 1998), estão
entre os mais comumente usados.
De acordo com Rocha & Vasconcelos Filho (1978),
o sudeste da Bahia é classificado como altamente
favorável ao mal-das-folhas. Para Gasparotto et al.
(1989), a temperatura e o período de molhamento
foliar influenciam significativamente a infecção de
folíolos de seringueira por M. ulei. Neste trabalho,
verificou-se umidade relativa média de 97% e
temperatura máxima de 26ºC e mínima de 19,5ºC,
nos dias de aplicação dos tratamentos em campo.
Além disso, foi observada, durante todo o período de
realização dos ensaios, alta pluviosidade na região.
A análise de variância dos valores de área abaixo da
curva de progresso de doença, estimados a partir dos
dados obtidos nas três épocas de avaliação de
severidade do mal-das-folhas, nos experimentos de
campo, mostrou que não houve efeito de clones,
tampouco da interação entre clones e tratamentos.
Contudo, houve efeito dos tratamentos aplicados (Figura 2).
Todos os isolados, em todos os clones estudados,
propiciaram redução na área foliar lesionada.
Os tratamentos com os isolados CEN 62, CEN 93 e
com a mistura de fungicidas não diferiram
estatisticamente entre si e foram os mais eficientes
no controle da doença, com os menores valores
médios de AACPD. Os isolados CEN 58 e CEN 91
apresentaram baixos valores médios de AACPD, se
comparados à testemunha, embora com valores
significativamente mais elevados em relação aos
demais tratamentos (Figura 2 A).
Na terceira avaliação, aos 135 dias, completados
45 dias da última aplicação, observou-se grande
incremento dos níveis de severidade do mal-dasfolhas, em todas as parcelas tratadas, provavelmente
em razão do fim do efeito residual dos tratamentos
aplicados.
Quanto à percentagem de estromas colonizados
por D. pulvinata, não houve interação significativa
entre os fatores períodos de avaliação (45, 90 e
135 dias após a aplicação) e isolados. Para todos os
isolados testados, os maiores valores médios de
percentagem de colonização de estromas de M. ulei
pelo hiperparasita ocorreram aos 45 dias após a
primeira aplicação. Entretanto, esses valores foram
decrescentes nas avaliações posteriores (Figura 2 B).
3
B
B
2
BC
C
C
T4
T5
1
0
T0
T1
T2
T3
Tratamentos
Estromas colonizados
(%)
184
50
B
A
40
B
30
B
20
B
B
B
B
10
0
45
90
135
Dias de avaliações
CEN CEN CEN CEN
58
62
91
93
Isolados
Figura 2. Severidade do mal-das-folhas da seringueira, em
condições de campo. A: área abaixo da curva de progresso da
doença (AACPD), considerando-se tempo (dias) como variável
independente e percentagem da área foliar lesionada como
variável dependente, em resposta aos tratamentos
(T0, testemunha; T1, CEN 91; T2, CEN 93; T3, CEN 58;
T4, CEN 62; T5, fungicida); B: percentagem de estromas de
Microcyclus ulei colonizados por Dicyma pulvinata, em
diferentes períodos de avaliação, em resposta à aplicação dos
isolados. Barras com letras iguais não diferem entre si pelo
teste de Tukey, a 5% de probabilidade.
Biocontrole do mal-das-folhas da seringueira
Conclusões
1. O hiperparasita Dicyma pulvinata não é
compatível com defensivos comumente utilizados nos
seringais da região Sudeste da Bahia.
2. O crescimento micelial do hiperparasita não é
afetado pela presença dos adjuvantes testados, porém a
esporulação pode ser afetada.
3. Os isolados de D. pulvinata CEN 58, CEN 62,
CEN 91 e CEN 93 são promissores para o controle
biológico de mal-das-folhas no Sudeste da Bahia.
Agradecimentos
185
INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS FLORESTAIS.
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Recebido em 28 de agosto de 2007 e aprovado em 21 de janeiro de 2008
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.43, n.2, p.179-185, fev. 2008